BCOMP - Tese de doutoramento
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- Contributos para o estudo da boga-portuguesa, iberochondrostoma lusitanicum collares-pereira, 1980: ecologia, reprodução e caracterização molecularPublication . Lima, Cristina Maria da Silva Conceição Branco de; Robalo, Joana Isabel Espírito-SantoNas últimas décadas as ameaças à biodiversidade têm sido cada vez mais numerosas, nomeadamente para os especialmente sensíveis ecossistemas de água doce. Estes ambientes ocupam uma área relativamente reduzida do planeta, porém onde a perda de biodiversidade parece ser mais elevada do que em ambientes terrestres. A Península Ibérica (PI) constitui um sistema isolado do resto da Europa no que diz respeito a espécies aquáticas. Este isolamento resulta da evolução geomorfológica da região com o estabelecimento dos Pirenéus. O surgimento de formações geológicas complexas, a alteração de escoamento das suas bacias hidrográficas e fenómenos tectónicos condicionaram o curso dos rios e ribeiras e, consequentemente, das espécies que neles habitavam. Os peixes de água doce, sendo peixes primários, são intolerantes à salinidade e a única forma de dispersarem é através de contactos entre linhas de água. Como consequência, as suas histórias evolutivas estão inevitavelmente ligadas às das bacias hidrográficas. A PI é rica em endemismos, com cerca de 80% das espécies estritamente dulciaquícolas endémicas. O mesmo se observa nas águas continentais portuguesas com 10 endemismos lusitânicos registados. Um desses endemismos é a boga-portuguesa, Iberochondrostoma lusitanicum Collares-Pereira 1980, espécie com estatuto de ameaça IUCN Criticamente em Perigo. Habita rios e ribeiros pouco profundos do tipo mediterrâneo nas bacias do Tejo, Sado e Ribeiras do Oeste tendo sido objecto de monitorizações em ambientes urbanos, particularmente, nas ribeiras da Lage, Barcarena, Rios Jamor, Lizandro e Ota. Estas monitorizações mostram uma variabilidade na estrutura populacional entre os vários locais e anos amostrados. Em alguns dos locais foram detectadas espécies exóticas e invasoras e o ensombramento registado foi considerado razoável, embora não correspondente à complexidade da galeria ripícola. Uma das ameaças conhecidas para as espécies de água doce continentais portuguesas é a degradação dos habitats que, aliada ao reduzido efectivo, impõe a necessidade de medidas de conservação mais imediatas que incluem a reprodução ex situ. Para isso, foi criado um Projecto de conservação com uma vertente de restauro ambiental associada a reprodução em cativeiro em condições seminaturalistas. A reprodução nestas condições foi bem-sucedida, com uma elevada produção de descendentes subsequentemente libertados nos locais de origem dos reprodutores. De modo a perceber as características das fases iniciais de vida foi registado o desenvolvimento de ovos e larvas de I. lusitanicum de uma população do Sado reproduzida em cativeiro. As fases embrionária e larvar, no seu conjunto, são relativamente longas, o que deixa os indivíduos vulneráveis a perturbações e ameaças durante mais tempo. As diferentes populações de I. lusitanicum estão isoladas em cursos de água sem contacto e para esclarecer as suas relações filogeográficas, realizou-se uma análise molecular que confirmou existirem diferenças significativas entre dois grandes grupos: Tejo+Oeste e Sado, e a análise morfológica dos indivíduos foi concordante com as diferenças moleculares encontradas. Deste modo, sugere-se a separação da população Tejo+Oeste numa espécie diferente, Iberochondrostoma tagensis.
- White-faced storm petrels in the northeast atlantic: contributions to the knowledge of their behaviour, ecology and conservationPublication . Alho, Maria; Catry, PauloCompreender o comportamento alimentar e reprodutor dos painhos, o grupo mais pequeno dos Procelariiformes, é crucial para compreender a sua ecologia e eficaz conservação. Apesar da sua ampla distribuição, estas aves têm sido pouco estudadas devido a desafios como o seu tamanho pequeno, comportamento noturno e locais de reprodução remotos. Dispositivos de seguimento miniaturizados começaram a fornecer informações sobre a sua distribuição e comportamento no mar, mas ainda há muito a descobrir sobre a sua dieta, comportamento, movimentos, rotas de migração e áreas de invernada. Esta tese de doutoramento concentrou-se principalmente na recolha e resumo de dados existentes sobre o comportamento alimentar e reprodutor dos painhos. Focou-se especialmente no calca-mar Pelagodroma marina. O estudo inclui uma análise do comportamento da procura de alimento e preferências alimentares do calca-mar, uma investigação de uma colónia extinta e uma avaliação da utilidade potencial de ninhos artificiais como ferramenta de investigação durante a época de reprodução. A minha revisão resume o conhecimento existente sobre o comportamento alimentar e reprodutor dos painhos, destacando a escassez de investigação nesta área e sublinhando as numerosas questões ecológicas não respondidas sobre a maioria das espécies de painhos, indicando a necessidade de futuras investigações. Pela primeira vez, investiguei o comportamento de procura de alimento do calca-mar na ilha Selvagem Grande (NE Atlântico), utilizando dispositivos GPS de 1g ao longo de dois anos consecutivos, durante os períodos de incubação e criação de crias. Foi também analisado amostras de fezes das crias através de DNA metabarcoding para caracterizar a sua dieta e examinou-se os níveis de mercúrio nas penas do corpo das crias. Os calcamares partiram da colónia sem uma preferência clara de direção e com um uso predominante de águas oceânicas profundas. Durante a criação de crias, estas aves exibiram maior atividade noturna, alimentando-se principalmente de presas mesopelágicas, conforme refletido pela dieta e pelos seus níveis relativamente elevados de mercúrio nas penas. Esta tese apresenta as primeiras informações sobre as populações de aves marinhas extintas na ilha de Santa Luzia, em Cabo Verde. A presença abundante de subfósseis de aves marinhas sugere que a ilha foi um importante local de reprodução para três espécies x de Procelariiformes, especialmente para o calca-mar. A datação por radiocarbono sugere que a colónia tenha desaparecido no início do século XX, possivelmente devido à presença humana e de animais domésticos. No entanto, após a erradicação de gatos assilvestrados, a ilha possui potencial para a recuperação das colónias de aves marinhas, uma vez que as populações extintas eram muito maiores do que as atuais em Cabo Verde. Finalmente, explorei a eficácia de ninhos artificiais para o calca-mar, com o objetivo de melhorar o monitoramento de aves reprodutoras, facilitar estudos durante a época de reprodução e conservação a longo prazo para painhos que nidificam em cavidades. Ninhos artificiais instalados dentro de ninhos naturais pré-existentes mostraram elevadas taxas de ocupação (83% em dois anos) e maior sucesso reprodutivo em comparação com ninhos naturais. O sucesso de eclosão foi maior em ninhos artificiais (>70%) em comparação com ninhos naturais. Foi observado abandono de ovos em ambos os tipos de ninhos, e a predação por lagartixas da Madeira foi menor em ninhos artificiais, sugerindo que oferecem uma melhor proteção, especialmente até à eclosão. Esta tese apresenta novos dados sobre o comportamento e a ecologia do calca-mar, com potenciais implicações para entender o comportamento de outros painhos, destacando a importância de estudos a longo prazo e paleoecologia para ações de conservação.
- "Heavy metals in atlantic seabirds: current levels and possible impacts in fitness and behaviour of selected species"Publication . Graça, Ricardo Miranda Furtado; Catry, PauloAs aves marinhas são omnipresentes, predadores de topo no oceano, e estão sujeitas a concentrações elevadas de metilmercúrio, mas as relações entre o mercúrio e o comportamento continuam a ser mal compreendidas. O foco central desta tese é determinar as concentrações de mercúrio e outros metais pesados em penas e sangue de aves marinhas e avaliar os efeitos da presença de mercúrio sobre o comportamento e a aptidão de algumas espécies de aves marinhas. 1. Os efeitos do mercúrio no comportamento das aves foram revistos no Capítulo 2. Os relatos de efeitos detectáveis do mercúrio no comportamento das aves são, de facto, poucos. Os efeitos detectáveis sobre o comportamento das aves são, na sua maioria, descritos em indivíduos expostos a concentrações subletais em laboratórios. Os efeitos, quando observados na natureza, são muitas vezes difíceis de descrever e quantificar. O efeito do mercúrio é mais amplamente estudado em aves adultas do que em aves jovens. Tanto quanto podemos verificar, o efeito do mercúrio no comportamento dos pintos das aves marinhas nunca foi estudado. 2. No Capítulo 3 foi feita uma análise dos efeitos do mercúrio na sobrevivência das aves marinhas. Apesar das provas de níveis elevados de mercúrio em aves marinhas, há muito poucos estudos robustos que reportem uma relação deletéria entre as concentrações de mercúrio em indivíduos e a sua aptidão. A sobrevivência da prole não parece ser afectada no ninho, embora alguns estudos prevejam taxas reduzidas de pulgas. A exposição ao mercúrio não parece causar alterações significativas na longevidade dos adultos, embora os estudos a longo prazo que incorporam dados sobre o mercúrio sejam limitados. É possível que as aves marinhas estejam adaptadas às concentrações relativamente elevadas de mercúrio presentes no ecossistema marinho. 3. A concentração de mercúrio e arsénio nas penas do corpo de cinco espécies de aves marinhas das Ilhas Falkland foi estudada no Capítulo 4. Neste estudo foram amostradas diferentes espécies e localizações nas Malvinas, para avaliar a variabilidade inter-espécies e espacial dentro desta região. Os pinguins roqueiros da Ilha Beauchene, tinham concentrações mais elevadas de mercúrio e arsénico do que os de outras colónias. A concentração de mercúrio em plumas de albatroz-de-sobrancelha-negra Thalassarche melanophris aumentou desde 1986. Os resultados sugerem que o arsénico não se biomagnifica da mesma forma que o mercúrio ao longo das teias alimentares. ix 4. Também estudámos (Capítulo 5) a concentração de elementos vestigiais no sangue de albatrozes de raça negra das Ilhas Falklands, que aqui mostramos, através do rastreio com geolocadores, forragens sobre a maior parte da Plataforma Patagónica. As concentrações de elementos vestigiais no sangue não foram significativamente diferentes entre ilhas, o que é consistente com as observações de comportamentos de forragens revelando que as aves de ambas as ilhas forragearam em geral as mesmas áreas nos meses que antecederam a amostragem. As concentrações de arsénio e selénio nas fêmeas eram mais elevadas do que nos machos. As diferenças relacionadas com o sexo na concentração destes elementos podem estar relacionadas com ligeiras diferenças desconhecidas na dieta ou com diferenças na assimilação entre os sexos. 5. A alma-negra Bulweria bulwerii (predadores aviários altamente especializados de presas mesopelágicas) foram utilizados como biomonitores dos níveis de mercúrio no domínio mesopelágico dos oceanos Pacífico e Atlântico no Capítulo 6. As colónias atlânticas mostraram concentrações mais elevadas de mercúrio do que as do Pacífico. Os níveis tróficos derivados da análise isotópica de compostos específicos para pintos eram semelhantes entre as colónias, sugerindo que as diferenças entre os locais não se deviam a diferenças no nível trófico dessas populações. Os níveis de mercúrio das penas registados foram inferiores aos registados em 1992 para o Atlântico. 6. Os possíveis efeitos adversos do mercúrio em pintos de alma-negra Bulweria bulwerii foram avaliados no Capítulo 7. A taxa de crescimento dos pintos foi negativamente correlacionada com a contaminação por mercúrio. Os pintos com coeficientes de taxa de crescimento reduzidos para a massa corporal apresentavam um crescimento retardado do comprimento das asas. Altas concentrações de mercúrio foram associadas ao atraso no crescimento dos pintos de alma-negra Bulweria bulwerii. O comportamento dos pintos no ninho não foi influenciado pelos níveis de mercúrio. 7. Os pintos de alma-negra Bulweria bulwerii têm algumas das mais elevadas concentrações de mercúrio no sangue relatadas entre as aves marinhas. Medimos o mercúrio no sangue de cada animal adulto de alma-negra Bulweria bulwerii e avaliámos o seu desempenho em termos de forragens. Não houve relação entre a contaminação por mercúrio e o desempenho de forragem, medido através da duração da viagem de forragem e do ganho diário de massa durante uma viagem de forragem. A alma-negra Bulweria bulwerii parece ser altamente resistente à contaminação por mercúrio. x Os resultados desta tese fornecem uma linha de referência para estudos de bioindicação utilizando penas e sangue de espécies seleccionadas de aves marinhas no Oceano Atlântico e Pacífico. Apesar dos níveis excepcionalmente elevados de mercúrio acumulado pelas aves marinhas, o seu comportamento parece em grande parte não ser afectado pelas concentrações de mercúrio em toda a gama aqui medida.
- Identifying marine key biodiversity areas using tracking dataPublication . Beal, Martin Stuart; Catry, Paulo XavierO impacto humano no ambiente marinho é substancial e crescente, causando uma preocupação pelo futuro de várias espécies marinhas. É necessário um leque de medidas para reduzir os impactos negativos, incluindo a implementação de áreas protegidas e a regulação das actividades humanas no mar. No entanto, para que os esforços sejam eficazes, precisamos de uma melhor compreensão da ecologia da biodiversidade marinha. O seguimento com recurso a dispositivos electrónicos revolucionou o estudo do comportamento e da ecologia dos animais marinhos, melhorando a capacidade de conservar os seus habitats. O foco central desta tese é a aplicação do seguimento de animais à ecologia e à conservação marinha. Apresentamos uma revisão bibliográfica, uma ferramenta de software, e análises espaciais para ilustrar as formas como os dados de seguimento têm e podem ser utilizados em estudos de conservação de espécies marinhas. Para demonstrar como o seguimento de animais contribuiu na progressão do conhecimento sobre o comportamento e a ecologia das espécies marinhas, apresentamos exemplos da literatura relativos a avanços na compreensão da migração, da procura de alimento e seleção de habitat, e da navegação em megafauna marinha, desde aves marinhas a cetáceos. Desenvolvemos uma ferramenta de software acessível, "track2KBA", na linguagem de programação R, que facilita a análise de dados de seguimento para identificar locais importantes para a conservação. Ilustrámos os passos de análise do software e fornecemos exemplos de como a ferramenta pode ser útil para analisar dados de seguimento de uma grande variedade de espécies, tanto no ambiente marinho como terrestre. Analisámos dados GPS de 23 espécies de aves marinhas para avaliar a importância do seguimento de populações ao longo dos anos com o objetivo de identificar sítios de importância para essas espécies. Descobrimos que, quando um número suficiente de indivíduos é seguido, a amostra de dados recolhidos num único ano fornece frequentemente estimativas robustas da distribuição das populações. Ao analisar os movimentos de 40 tartarugas-verdes fêmeas (Chelonia mydas) de uma população (importante ao nível global) na Guiné-Bissau, África Ocidental, avaliámos a qualidade de uma rede regional de áreas marinhas protegidas para a conservação de tartarugas ao longo das estações,em vários países. Verificámos que as tartarugas são espacialmente bem protegidas entre eventos de desova, menos protegidas durante a migração, e que a protecção dos locais de alimentação dependia do país para onde migravam. Analisámos dados de seguimento de 39 espécies de albatrozes e espécies semelhantes (cagarras e pardelas) para quantificar, pela primeira vez, as áreas sob diferentes jurisdições, e a ligação entre elas, de que dependem estas aves marinhas severamente ameaçadas. Verificámos que estas aves passam 39% do seu tempo em áreas do alto-mar para além de jurisdições nacionais, e que através dos seus movimentos elas unem as jurisdições de numerosos países em todo o mundo, indicando a necessidade de uma cooperação internacional para que a sua conservação seja eficaz. As análises de dados de seguimento de espécies individuais e de grupos de espécies apresentadas nesta tese representam aplicações inovadoras à escala local, regional e global. Este trabalho contribui directamente para a identificação de locais importantes para a biodiversidade, tais como as “marine Key Biodiverisity Areas”, e para o desenvolvimento de colaborações internacionais para a conservação da biodiversidade marinha tanto em águas nacionais como em alto mar.
- Evolução dos cuidados parentais e da parentalidade em peixes ósseos da subclasse actinopterygii : uma abordagem filogenéticaPublication . Crespo, Ana Maria de Azambuja Farinha da Conceição PereiraOs cuidados parentais referem-se ao investimento pós-fertilização realizado pelo(s) progenitor(es), que possibilita o aumento da sobrevivência e do sucesso reprodutor dos descendentes, enquanto a parentalidade diz respeito ao(s) sexo(s) cuidador(es). A subclasse Actinopterygii exibe considerável diversidade de comportamentos parentais, encontrando-se igualmente presentes todas as formas de parentalidade. Os estudos filogenéticos da evolução dos cuidados parentais são escassos, assentando alguns na parentalidade, com resultados contraditórios entre estudos. A abordagem filogenética actual consiste no mapeamento de caracteres em filogenias, através da associação dos estados dos caracteres aos taxa terminais, permitindo a reconstituição histórica da evolução dos caracteres, mediante a utilização de "software" adequado (e.g., Mesquite). Foram conduzidos alguns mapeamentos de cuidados parentais e de parentalidade em filogenias aos níveis da família e do género, tal como foi mapeada a parentalidade numa filogenia da subclasse Actinopterygii, não sendo porém conhecido à escala global nenhum estudo de mapeamento de cuidados parentais. A presente dissertação pretendeu, através do mapeamento de caracteres, testar um conjunto de hipóteses, de acordo com as quais, a guarda evoluiu da ausência de cuidados parentais e originou independentemente a incubação oral e o transporte externo de ovos, tendo a parentalidade evoluído direccionalmente através da sequência de transições «ausência de parentalidade, uniparentalidade masculina, biparentalidade, uniparentalidade feminina» (i.e., modelo "stepping-stone"). Foi recolhida e compilada informação respeitante aos cuidados parentais e à parentalidade numa base de dados compreendendo 389 famílias. Da análise da base de dados, constatou-se a presença de cuidados parentais em 23,9 % das famílias amostradas, nas quais a guarda e a uniparentalidade masculina constituíram as formas predominantes de cuidados parentais e de parentalidade, respectivamente. Os caracteres em estudo foram mapeados em três filogenias moleculares, incidindo nos seguintes taxa: coorte Osteoglossomorpha, ordem Siluriformes e subclasse Actinopterygii. Na subclasse em estudo, os cuidados parentais e a parentalidade evoluíram de ancestrais sem cuidados parentais nem parentalidade. Ao nível global, a transição do estado ancestral para a guarda, bem como a transição do estado ancestral para a uniparentalidade masculina foram as mais observadas, tendo as restantes registado ocorrências minoritárias. Relativamente à evolução dos cuidados parentais, os dados apoiaram a origem da incubação oral na guarda, ao passo que o transporte externo de ovos evoluiu da guarda e directamente do estado ancestral, sugerindo a não existência de um padrão evolutivo único. No que diz respeito à evolução da parentalidade, os dados não apoiaram o modelo stepping-stone, não tendo sido observada a sequência predita completa. Apenas foram registadas cinco a sete sequências transicionais «estado ancestral, uniparentalidade masculina, biparentalidade», não tendo sido apoiada a assunção da biparentalidade como estado intermédio entre a uniparentalidade masculina e a uniparentalidade feminina. Adicionalmente, a evolução da parentalidade revelou uma diversidade de transições entre estados superior àquela observada na evolução dos cuidados parentais, sugerindo a não existência de um padrão sequencial evolutivo único aplicável à subclasse Actinopterygii. A congruência, geralmente observada, entre estados inferidos de cuidados parentais e de parentalidade para as famílias não documentadas sugeriu o interesse do mapeamento de caracteres no fornecimento de dados relativos a estas famílias.
- Neuroendocrine regulation of social Interactions in a cichlid fishPublication . Félix, Ana Sofia Mendes da Silva SantosO estudo do comportamento animal e em particular do comportamento social tem atraído investigadores desde há muito tempo. Todos os animais interagem com os outros, característica fundamental para a sua sobrevivência e reprodução. No entanto, para obter uma total compreensão do comportamento social, é necessária a integração de seus vários componentes. Com esta tese, pretendemos clarificar este tópico, estudando como o cérebro controla o comportamento através da ação conjunta de seus circuitos neurais, genes e moléculas, e também como o ambiente social de forma recíproca influencia o cérebro. Baseado neste objetivo e usando a tilápia de Moçambique (Oreochromis mossambicus) como espécie modelo, num primeiro estudo investigámos como o comportamento social é controlado por uma rede dinâmica de regiões cerebrais, a Social Decision Making Network (SDMN). Aqui, tentámos entender quais são as pistas específicas que desencadeiam mudanças no padrão de ativação dessa rede neural, usando lutas entre machos. Os nossos resultados sugerem que é a avaliação mútua do comportamento de combate que impulsiona mudanças temporárias no estado do SDMN, e não a avaliação do resultado da luta ou apenas a expressão de comportamento agressivo. Em seguida, explorámos a modulação hormonal do comportamento social, em particular pelo neuropeptídeo vasotocina. Para isso, manipulámos o sistema da vasotocina injetando vasotocina e um antagonista específico dos receptores de vasotocina V1A em machos. Para distinguir se a vasotocina afeta o comportamento isoladamente ou em combinação com andrógenios, conduzimos esta experiência em peixes castrados e peixes controlo. Curiosamente, descobrimos que a vasotocina afetou o comportamento dos machos em relação às fêmeas, mas não em relação aos machos, e que os andrógenios e a vasotocina modularam a agressividade dos machos em relação às fêmeas. Em seguida, procurámos compreender como as interações sociais afetam os sistemas neuroendócrinos. Nesse sentido, utilizámos um paradigma de intrusões territoriais para avaliar os padrões temporais dos níveis de andrógenios e tentámos relacioná-los ao fenótipo comportamental de cada indivíduo. Obtivemos padrões distintos de resposta androgénica às interações sociais devido a diferenças individuais subjacentes em sua extensão de resposta. Este estudo oferece uma importante contribuição para a área de investigação, fornecendo possíveis razões para as discrepâncias associadas à hipótese de desafio, o principal modelo em endocrinologia comportamental que descreve a relação entre andrógenios e interações sociais. Finalmente, pensa-se que os andrógenios respondem às interações sociais como forma de preparar os indivíduos para outras interações. Assim, tentámos descobrir como um aumento de andrógenios no sangue afeta o cérebro. Para esse efeito, injetámos peixes com andrógenios e estudámos as mudanças transcriptómicas que ocorrem no cérebro usando a técnica de RNAseq, permitindo uma compreensão mais detalhada do efeito dos andrógenios no cérebro. Em suma, o comportamento social é complexo e depende de vários fatores internos e externos. Os resultados desta tese fornecem um contributo significativo para pesquisas futuras.
- Multi-regional acoustic repertoires of bottlenose dolphins : commom themes, geographical variatons and ecological factorsPublication . Luís, Ana Rita Francisco; Santos, Manuel Eduardo dosOs golfinhos-roazes (Tursiops truncatus) são conhecidos por produzirem uma multiplicidade de sons, tanto para comunicação como para ecolocalização. O seu repertório acústico inclui sinais tonais com modulação de frequência – assobios, emissões curtas, de banda-larga e alta-frequência, os cliques de ecolocalização, e “pacotes” de pulsos de bandalarga e elevada taxa de repetição – sons pulsados. Esta tese centra-se no repertório acústico alargado da espécie T. truncatus e disponibiliza descrições detalhadas dos temas comuns, tanto a uma escala local com a uma escala geográfica alargada. Através de um estudo comparativo multi-regional, as (dis)similaridades no repertório foram avaliadas e as variações acústicas foram documentadas para nove populações de golfinhos-roazes do oceano Atlântico e do mar Mediterrâneo. A ocorrência de vocalizações universais em populações geograficamente distantes, mas também a variabilidade intraespecífica observada em grupos simpátricos que apresentam diferentes características eco-etológicas, sublinha a importância de fatores ambientais na modelação das emissões acústicas destes golfinhos. Ao estudar a estabilidade a longo-termo de assobios estereotipados, e a produção abundante de assobios não estereotipados em contextos alimentares específicos, foi possível corroborar o papel dos assobios como sinais de identidade. De modo a contribuir para um melhor entendimento acerca dos diferentes tipos de sinais que são usualmente nomeados como “Sons pulsados”, uma combinação de representações gráficas – sonogramas e dados quantitativos são aqui apresentados. Esta abordagem revelou que “rangidos”, “chorincos” e “buzzes”, vulgarmente agrupados em estudos de repertórios acústicos, são sinais acústicos distintos com diferenças significativas ao nível das suas características temporais e de frequência. Sequências rítmicas são também uma componente importante do repertório acústico dos golfinhos. Neste estudo, os zurros gravados no estuário do Sado, em Portugal, foram utilizados como base para a caracterização estrutural dos diferentes elementos acústicos que compõem estas sequências repetitivas, e técnicas de teoria da informação foram aplicadas para analisar a ordem dos elementos e a complexidade das sequências. Características-chave dos zurros mostram que estas vocalizações são emitidas de modo não-aleatório, o que sugere a presença de conteúdo informativo relevante, uma nova perspectiva sobre estas emissões acústicas mal conhecidas. Finalmente, a influência do tráfego marítimo, especialmente o ruído gerado pelos navios, nos repertórios acústicos de golfinhos-roazes não deve ser subvalorizado, uma vez que as embarcações contribuem marcadamente para a paisagem acústica subaquática atual. Decréscimos significativos nas taxas de emissão e alterações temporárias nas características espectrais dos assobios, aqui documentadas, revelam a existência de respostas acústicas à proximidade de embarcações, e adaptações locais a um ambiente mais ruidoso. Uma descrição enquadrada dos diferentes elementos vocais que fazem parte do repertório acústico da espécie golfinho-roaz, bem como da influência de fatores ecológicos, nomeadamente o ruído produzido por embarcações, aqui apresentados, pretendem ser contributos substanciais para o conhecimento do sistema de comunicação acústica desta espécie que deveriam ser utilizados em esforços de conservação.
- Neurobehavioural and molecular mechanisms of social learning in zebrafishPublication . Pinho, Júlia Sabrina Ferreira de; Oliveira, Rui FilipeOs animais utilizam informação social e não social para tomarem decisões adaptativas que tem impacto no seu fitness. O uso de informação social traz vantagens como escapar a um predador, encontrar fontes de comida ou evitar lutas com indivíduos mais fortes, apenas por observação dos seus conspecíficos ou produtos relacionados com eles. A aprendizagem social ocorre quando os indivíduos observam o comportamento de outros ou as suas consequências para modificar o seu próprio comportamento. Esta estratégia comportamental é conservada entre espécies: os grilos, Nemobius sylvestris, adaptam o seu comportamento para evitar um predador depois de observar o comportamento de outros e mantem essas mudanças comportamentais, duradouramente, mesmo apos os demonstradores não estarem presentes; as abelhas operárias, Apis Mellifera, apresentam uma série de comportamentos motores estereotipados que informam outras operárias da localização precisa de uma fonte de comida. Os mecanismos neuronais da aprendizagem social não estão claramente compreendidos, e são o centro de debate nesta área de investigação. Alguns autores hipotetizam que os mecanismos neurais da aprendizagem social são partilhados, e outros autores defendem que a aprendizagem social é um domínio geral presente até em espécies solitárias. O principal objetivo deste trabalho é clarificar os mecanismos subjacentes a aprendizagem social e não social. Este trabalho subdivide-se em dois capítulos experimentais: o capítulo II, onde procuramos os circuitos neurais do condicionamento observado com um estímulo social ou não social; e capitulo III, no qual a eficácia de estímulos sociais químicos e visuais é testada num paradigma de condicionamento aversivo. Em ambos os capítulos, um gene de ativação imediata são usados como marcadores de atividade neuronal: no capítulo II utilizando a expressão de c-fos, por hibridação insitu, para mapear as regiões do cérebro recrutadas em aprendizagem social e não social; e no capítulo III, a reação quantitativa em cadeia da polimerase foi utilizada numa abordagem com genes e regiões do cérebro candidatas para perceber o envolvimento do sistema olfativo em aprendizagem social olfativa. No capítulo II, nós demonstramos que a aprendizagem social (SL) recruta diferentes regiões do cérebro quando comparada com a aprendizagem não social (AL): SL aumenta a expressão de c-fos nos bulbos olfativos, na zona ventral da área telencefálica ventral, na habénula ventral, no tálamo ventromedial e a AL diminui a expressão de c-fos na habénula dorsal e no núcleo tubercular anterior. Alem disso, conjuntos diferenciais de regiões cerebrais aparecem associados a aprendizagem social e não social depois de uma análise funcional da conectividade entre as regiões do cérebro. No capítulo III, nós mostramos que pistas sociais visuais, como a observação de um conspecífico a exibir uma resposta de alarme, não é eficaz como um estimulo não condicionado (US), mas pistas sociais olfativas, como substância de alarme, foi altamente eficiente como US em aprendizagem aversiva. Além disso, identificamos os bulbos olfativos como uma área do cérebro essencial para condicionamento observado olfativo. Uma análise funcional da coesão e conectividade dos núcleos do cérebro envolvidos em processamento olfativo mostraram uma rede apurada para condicionamento observado olfativo. Em resumo, a presente tese elucida o debate nesta área de investigação sobre os mecanismos da aprendizagem social. Este trabalho clarifica que ao nível comportamental a aprendizagem social requer um domínio geral e ao nível neuronal é necessária uma rede modular que permite a computação em simultâneo de várias informações com diferentes níveis de complexidade.
- Social buffering of fear in zebrafishPublication . Faustino, Ana Isabel Soares; Oliveira, Rui FilipeA ubiquidade da formação de grupos em animais tem sido explicada, entre outros aspectos, pelos seus benefícios na proteção contra predadores, nomeadamente devido ao aumento global do estado de vigilância, diluição do risco e capacidade de confundir o predador. Assim, os grupos sociais proporcionam um ambiente mais seguro na presença de ameaças, onde a presença de conspecíficos diminui o medo desencadeado por eventos aversivos que surjam no ambiente, um fenómeno designado por “social buffering”. Este fenómeno social tem sido verificado em mamíferos, onde já existe alguma evidência sobre os mecanismos neurais envolvidos, mas o seu estudo em outros vertebrados ainda é escasso. Por esta razão, são necessários mais estudos comparativos para melhor compreender a evolução do “social buffering” entre animais sociais e quão evolutivamente conservados são os mecanismos subjacentes a este comportamento social. Diferentes modalidades sensoriais (através de “cues”) podem promover este efeito de “buffering” e a eficácia de cada canal sensorial neste fenómeno comportamental pode variar entre espécies. Além disso, do que é sabido, a eficácia ao longo do tempo de diferentes “cues” sensoriais, bem como a eficiência de grupos sociais que divirjam no seu número de elementos, nunca foi testada no contexto de “social buffering”. Estas questões adquirem especial importância se considerarmos que exposições mais prolongadas a ameaças e grupos sociais maiores, influenciam as probabilidades de sobrevivência do indivíduo. Dada a sua posição filogenética, os peixes teleósteos permitem explorar o “social buffering” e os mecanismos envolvidos neste comportamento social, na radiação evolutiva de maior sucesso entre os vertebrados (paralela à dos tetrápodes). O peixe-zebra é uma espécie pertencente aos teleósteos que apresenta comportamentos de medo quando submetido a situações ameaçadoras em contextos de isolamento social, no entanto a ocorrência de “social buffering” nesta espécie permanece praticamente inexplorada. Nesta tese, investigámos a ocorrência de “social buffering” no peixe-zebra, submetendo peixes focais a um estímulo aversivo (substância de alarme) quer na presença ou ausência de “cues” sensoriais sociais. Numa primeira experiência, mostrámos que quando submetidos à substância de alarme na presença de “cues” sociais olfactivas (água do cardume) e visuais (visualização do cardume), os peixe-zebra apresentaram uma resposta de medo inferior do que quando submetidos à substância de alarme sozinhos (durante 30 minutos de exposição) revelando a ocorrência de “social buffering” continuado da resposta de medo. No entanto, análises ao cortisol ou RNA mensageiro da hormona libertadora de corticotrofina (CRF), dos receptores de glucocorticóides, e receptores de mineralocorticóides, não revelaram evidências de “buffering” da resposta de stress. Numa segunda experiência, testámos separadamente a eficácia de “cues” olfactivas e visuais no fenómeno de “social buffering”, e verificámos que a visualização do cardume de peixes-zebra se revelou a “cue” mais eficaz na diminuição da resposta de medo provocada pela substância de alarme, quando num cenário de exposição constante à ameaça (30 minutos). Numa terceira experiência, demonstrámos que este “buffering” social não depende do número de conspecíficos presentes no cardume, uma vez que cardumes mais pequenos se revelaram igualmente eficazes em diminuir a resposta de medo provocada pela substância de alarme. Finalmente, usando a expressão génica de um “immediate early gene” (c-fos) como indicador de atividade neuronal, verificámos que o fenómeno de “social buffering” em peixezebra desencadeia um padrão específico de co-activação de áreas cerebrais conhecidas pelo seu envolvimento em respostas de medo e “buffering” em mamíferos. Concluindo, o conjunto de estudos apresentados nesta tese sugerem uma origem evolutiva comum nos vertebrados para o comportamento de “social buffering”, providenciando novas perspectivas sobre os mecanismos comportamentais e neurais envolvidos neste comportamento social.
- Etologia social e endocrinologia comportamental da tilapia oreochromis mossambicus (teleostei, cichlidae)Publication . Oliveira, Rui FilipeCom a presente dissertação pretende-se estudar os aspectos funcionais e causais envolvidos no comportamento social dos Ciclídeos africanos incubadores bucais, sobretudo no que diz respeito às interacções entre as hormonas e o comportamento, e ao seu significado funcional, tendo sido escolhida como modelo para estudo a Tilápia de Moçambique Oreochromis mossambicus (Peters 1852). Nesta perspectiva, a presente dissertação apresenta-se, grosso modo, organizada em duas partes complementares: na primeira, procede-se à caracterização do comportamento social da espécie em estudo, nomeadamente no que diz respeito às hierarquias de dominância e à dinâmica das interacções sociais, e na segunda, analisam-se os correlatos comportamentais, morfo-funcionais e endócrinos do estatuto social nos machos, dando-se especial atenção às inter-relações entre as hormonas e o comportamento. Finalmente, apresentam-se dados recolhidos durante o presente trabalho que apontam para a existência de tácticas alternativas de reprodução nos machos desta espécie, e procede-se, ainda, à caracterização do comportamento das fêmeas durante o ciclo de incubação bucal dos alevins. De seguida apresenta-se um pequeno resumo do conteúdo de cada um dos capítulos. Na Parte I (capítulos 1 a 4) procede-se à apresentação do problema e à revisão da literatura relevante para o presente trabalho. Assim, faz-se uma caracterização da biologia social dos Ciclídeos africanos, especialmente no que diz respeito aos modos de reprodução e aos tipos de cuidados parentais existentes neste grupo. De igual modo, apresenta-se uma sinopse da biologia geral da espécie em estudo, nos seus múltiplos aspectos: sistemática e zoogeografia, factores abióticos, ecologia alimentar e reprodução. Finalmente, é apresentada uma resenha monográfica das inter-relações entre hormonas e comportamento em Teleósteos, englobando os seguintes aspectos: caracterização dos esteróides sexuais em Teleósteos, o papel dos androgénios e dos progestogénios no comportamento social em machos de Teleósteos; os ciclos sazonais de esteróides sexuais e a sua relação com o comportamento reprodutor, os mecanismos de acção dos esteróides sexuais sobre o comportamento e a relação bidireccional hormonas-comportamento; e, quais as estratégias de investigação em endocrinologia comportamental. Na Parte II (capítulo 5) é apresentada a metodologia geral comum a todo o trabalho, sendo fornecidos dados sobre a manutenção e reprodução dos indivíduos em cativeiro, e sobre os procedimentos experimentais e estatísticos utilizados. E de referir que o presente trabalho se baseou em três estudos, tendo-se tido a preocupação de sacrificar o menor número de animais possível, maximizando-se a informação recolhida dos indivíduos de cada estudo. Em cada um dos estudos foram realizadas observações de comportamento de indivíduos mantidos em grupos padronizados (estudo 1: 8 grupos heterossexuais de ó indivíduos cada, estudo 2: 8 grupos heterossexuais de 6 indivíduos cada; estudo 3: 4 grupos machos de 4 indivíduos cada, aos quais são adicionadas 2 fêmeas ovuladas por grupo ao fim de 5 dias), e no final os indivíduos foram sacrificados para recolha de amostras biológicas (i.e. gónadas, encéfalos, biometrias), excepto no caso do estudo de curto-prazo (estudo 3) em que se utilizaram amostras de urina para o doseamento dos esteróides sexuais, tendo-se evitado o sacrifício dos animais envolvidos neste estudo. Na Parte III (capítulos 6 a 13) são apresentados e discutidos os resultados dos estudos levados a cabo, os quais estão resumidos abaixo. No capítulo 6 procedeu-se à inventariação e descrição dos padrões elementares de comportamento e de coloração, como forma de caracterizar o repertório comportamental da espécie. Discutiu-se qual a função adaptativa da construção e defesa de ninhos pelos machos em espécies incubadoras bucais maternas, e analisou-se a possível evolução e o design das posturas de submissão em Ciclídeos. No capítulo 7 caracterizou-se a organização social dos grupos em cativeiro (estudo 1), tendo sido detectada a formação de hierarquias de dominância, com estrutura linear e semi-despótica (o indivíduo a participa em mais de metade das interacções do grupo). O tamanho do corpo e o sexo dos indivíduos são factores importantes na decisão das interacções agonísticas: os indivíduos α (dominantes) de cada grupo são sempre machos e são os membros de maiores dimensões dos grupos a que pertencem. Embora os indivíduos tenham sido criados juntos durante um longo período de tempo, são comuns interacções agonísticas que envolvem agressão de alta intensidade, o que indica que neste estádio (maturação sexual) os indivíduos efectuam avaliações frequentes das capacidades competitivas dos outros elementos do grupo. Foram ainda analisadas as redes de interacções no interior dos grupos, tendo sido desenvolvidas para o efeito técnicas de estatística de simulação para a análise de dados sociométricos. As interacções agonísticas são especialmente comuns entre machos, sendo menos frequentes entre machos e fêmeas, e entre fêmeas. Os indivíduos ω (subordinados) participam em menos encontros agonísticos do que o esperado. De acordo com a distância hierárquica, os vizinhos na hierarquia estão envolvidos em menos interacções agonísticas do que o esperado, excepto para as interacções simétricas, as quais representam uma pequena proporção do número total de interacções. Este dado é contrário às expectativas, mas pode ser explicado pelo facto de a agressão ser iniciada preferencialmente pelos indivíduos dominantes contra indivíduos que lhes são claramente subordinados, presumivelmente para manterem o seu estatuto social. Foi ainda demonstrado que o índice de dominância, vitórias/ (vitórias + derrotas), é um muito bom preditor da posição hierárquica dos indivíduos nas ordens de dominância dos seus grupos. É argumentado que, em espécies nas quais as interacções agonísticas não são controladas por processos que envolvem operações cognitivas complexas, este índice de dominância pode ser um indicador biologicamente realista da motivação agressiva dos indivíduos. No capítulo 8 estudou-se a dinâmica do estabelecimento das hierarquias de dominância e sua estabilidade ao longo do tempo. No estudo de curto-prazo (7 dias, estudo 3), durante o processo de formação de grupos de machos foi detectada consistentemente a seguinte sequência temporal de actividades predominantes: (a) avaliação mútua dos membros do grupo e formação das hierarquias de dominância; (b) estabelecimento dos territórios e construção dos ninhos; (c) cortejamento. Sugere-se que estes resultados reflectem a sequência provável de acontecimentos que ocorrem durante o processo de formação de uma arena reprodutora na natureza, no início de cada episódio de reprodução. Do estudo de longo-prazo (8 semanas, estudo 2) foi concluído embora a maior parte das estruturas de dominância seja linear, elas são instáveis de semana para semana. Isto é, sucedem-se no tempo estruturas lineares nas quais, no entanto, os indivíduos não ocupam as mesmas posições hierárquicas relativas. A estabilidade das posições hierárquicas é superior nos indivíduos dominantes de cada grupo, os quais sofrem menos reversões hierárquicas do que os subordinados. As reversões na ordem de dominância de um grupo são especialmente comuns entre vizinhos hierárquicos. As hierarquias de dominância não estabilizaram durante o período de tempo deste estudo. No capítulo 9 avaliaram-se as relações existentes entre o estatuto social dos indivíduos e um conjunto de variáveis comportamentais, entre as quais a territorialidade, os padrões de coloração, o acesso às fêmeas, a construção e manutenção dos ninhos, os comportamentos agonísticos e os comportamentos sexuais. Os indivíduos dominantes apresentam uma coloração mais escura do corpo, têm prioridade no estabelecimento de territórios, constroem ninhos de maiores dimensões e monopolizam o acesso às fêmeas do grupo a que pertencem. Os dados sustentam a hipótese de que os indivíduos dominantes são os que investem mais em comportamentos agonisticos, tendo como benefício deste investimento um maior acesso às fêmeas, segundo uma cascata comportamental: dominância social —> estabelecimento de um território —> construção do ninho —> acesso a fêmeas. No capítulo 10 investigaram-se as relações existentes entre o estatuto social e um conjunto de caracteres morfo-fisiológicos, entre os quais medidas biométricas (e.g. comprimento, peso, dimensões das barbatanas, etc.), indicadores da maturidade sexual (e.g. índice gonado-somático); das condições bioenergéticas (índice hepatosomático e factor de condição), e dos níveis de androgénios (dilatação da papila urogenital). Para uma avaliação correcta das variáveis biométricas foi realizado um estudo prévio sobre a existência de alometrias e de dimorfismo sexual na morfologia externa da espécie, tendo sido detectados dois complexos morfológicos sexualmente dimórficos: altura das barbatanas anal e dorsal, focinhos afilados com mandíbulas robustas nos machos. Colocou-se a hipótese destes caracteres morfológicos terem evoluído por selecção sexual, uma vez que conferem vantagens fenotípicas em termos de mecanismos comportamentais de defesa territorial e escolha do parceiro sexual por parte das fêmeas. Uma vez identificados estes complexos morfológicos procedeu-se à averiguação da sua expressão em machos com diferente estatuto social, verificando-se que os indivíduos dominantes apresentam uma acentuação destes caracteres. Comof simultaneamente, estes indivíduos também apresentam papilas maiores, as quais são utilizadas como indicadores dos níveis fisiológicos de androgénios, colocou-se a hipótese de a dominância social, através de uma elevação dos níveis de androgénios circulantes, acentuar a expressão de características sexualmente dimórficas. Foi também demonstrado que os indivíduos dominantes possuem índices gonado-somáticos superiores aos dos subordinados, não diferindo estas duas classes de machos no que diz respeito às variáveis bioenergéticas (i.e. índice hepato-somático e factor de condição). Observou-se ainda que os indivíduos dominantes têm o aparelho sónico (i.e. placas faríngicas e musculatura sónica) mais desenvolvido do que o dos subordinados, o que deixa adivinhar um papel importante da produção de sons para o estabelecimento das relações de dominância. No capítulo 11 estudaram-se os correlatos endócrinos do estatuto social, nomeadamente a relação de causa-efeito entre o estatuto social nos machos e os níveis de esteróides sexuais, i.e. androgénios e progestogénios, e sua modulação pelo contexto social, através do doseamento das hormonas na urina por radio-imunoensaios (RIA), e a metabolização neural dos androgénios. No estudo de curto-prazo, após 8 dias de isolamento social nenhum dos esteróides estudados (i.e. testosterona, 11-cetotestosterona, 17,20α-P, e 17,20β-P) era bom preditor da dominância social desenvolvida após a subsequente formação dos grupos de machos. Um dia após a formação dos grupos os índices de dominância são já bons preditores das concentrações urinárias de todos os esteróides sexuais. Assim, as interacções sociais têm um efeito importante de curto-prazo na modulação das concentrações dos esteróides sexuais em O. mossambicus. Os índices de dominância e as concentrações de androgénios, medidos após a formação dos grupos só de machos, estão correlacionados positivamente com a territorialidade, a taxa de cortes, e as dimensões dos ninhos. Foram detectadas relações semelhantes para os progestogénios, com a excepção de que a 17,20β-P e a taxa de cortes não se encontram correlacionadas. A formação dos grupos só de machos foi acompanhada de um aumento das concentrações urinárias dos esteróides sexuais em machos territoriais e um decréscimo em machos não-territoriais, com excepção para a testosterona, que aumenta em ambos os grupos. A introdução de fêmeas ovuladas nos grupos causou um retorno das concentrações de esteróides para níveis próximos dos do isolamento social, excepto para 17r20a-P que apresenta um grande incremento nos indivíduos territoriais. É discutido o possível papel de cada um dos esteróides. Foi também desenvolvido um ensaio radiométrico para a quantificação da actividade da aromatase, que controla a metabolização de androgénios em estrogénios. Investigou-se a distribuição neuroquimica da aromatase no sistema nervoso central e as suas eventuais relações com o comportamento sexual masculino e com o estatuto social. Não foram detectadas relações entre a actividade deste enzima e o estatuto social. No entanto, existem diferenças significativas entre os dois sexos, sendo o enzima mais activo nos machos. Neuroanatomicamente o enzima apresenta uma maior actividade no tálamo e no telencéfalo, duas estruturas classicamente consideradas como estando envolvidas no controlo dos comportamentos sociais e do eixo reprodutor nos Vertebrados. No capítulo 12 descreveu-se a existência de tácticas alternativas de acasalamento nos machos. Assim, enquanto os dominantes estabelecem territórios para os quais atraem as fêmeas, os subordinados, que não são bem sucedidos territorialmente, adoptam o comportamento das fêmeas, deixando-se cortejar e mantendo-se assim na imediação dos ninhos. Nas ocasiões em que se verificaram desovas os machos subordinados interferiram com o par tentando fertilizar alguns dos ovos da postura. No capítulo 13 caracterizou-se o comportamento social feminino ao longo do ciclo de incubação bucal. As fêmeas não apresentam nenhuns indícios de comportamentos agressivos durante todo o ciclo excepto na fase em que incubam alevins com alimentação exógena. Nesta fase, o padrão de coloração das fêmeas altera-se e passam a defender um espaço na sua vizinhança no qual não permitem a presença de outros indivíduos. Este espaço parece ser destinado às excursões que os alevins realizam fora da cavidade bucal materna nesta fase. Observou-se ainda que o tamanho das posturas incubadas diminui gradualmente ao longo do ciclo de incubação bucal, colocando-se a hipótese de as fêmeas praticarem canibalismo filial como um meio de viabilizarem a restante postura e de evitarem um abaixamento da sua condição física, uma vez que durante todo o ciclo se abstêm de se alimentar. Na Parte IV os resultados são integrados numa discussão final subordinada ao tema "Uma abordagem causal e funcional do sistema de acasalamento de Oreochromis mossambicus" (capítulo 14). São ainda analisados alguns temas teóricos, cuja discussão se tornou pertinente no âmbito do presente trabalho, nomeadamente a selecção sexual (capítulo 15), e a evolução da 11-cetotestosterona nos Teleósteos como principal esteróide sexual masculino (capítulo 16).